Notícias

Neste módulo disponibilizaremos Notícias e matérias para auxiliar o público em geral.

 

IVIABILIDADE DE RETIFICAÇÃO POR ATA NOTARIAL

Necessária nova manifestação de vontade das partes, por meio de escritura de re-ratificação .

Despachos/Pareceres/Decisões 59/2009

Parecer 59/2009-E - Processo CG 2008/45352
Data inclusão: 18/05/2009

(59/2009-E)

RECURSO ADMINISTRATIVO

Recorrente: Espólio de Alberto Badra e outro

Ref.: 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de Suzano

 

 Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

 

 REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura pública de divisão amigável – Erro na descrição dos lotes – Retificação por Ata Notarial – Inviabilidade – Necessária nova manifestação de vontade das partes, por meio de escritura de re-ratificação – Recurso não provido.

  

Cuida-se de recurso interposto por Espólio de Alberto Badra e Espólio de Somaia Badra contra decisão do MM. Juiz Corregedor Permanente do 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de Suzano (fls.220) que indeferiu pedido de providências para que, através de ata notarial, se retificasse escritura pública de divisão, tendo por objeto 2.623 lotes, distribuídos em 78 quadras e 07 glebas, que compõem o loteamento Cidade Miguel Badra, na Cidade de Suzano.

Os recorrentes sustentaram ser possível a retificação pleiteada, visto que o próprio Tabelião reconheceu já ter retificado erros materiais em situações anteriores, quando o pedido não altera a vontade das partes, não afeta elementos essenciais do negócio jurídico, não depende da vontade das partes, não representa risco de prejuízo a terceiros, e é feito mediante a simples apresentação de documentos, sendo certo que todos esses requisitos estariam presentes ‘in casu’.

O I. Representante do Ministério Público opinou pelo não provimento do recurso.

 

É o relatório.

Opino.

Em primeiro lugar, ressalte-se que embora os recorrentes tenham intitulado seu recurso como apelação, trata-se na verdade de recurso administrativo, como tal devendo ser apreciado, nos termos do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, já que o inconformismo foi manifestado contra r. decisão proferida no âmbito administrativo pelo MM. Juiz Corregedor Permanente da Serventia Extrajudicial em exame.

O presente recurso não merece provimento.

Os recorrentes pretendem retificar, através de ata notarial, escritura pública de divisão amigável lavrada aos 08 de outubro de 1977 nos livros 130-A e 130-B perante o 1° Tabelião de Notas de Suzano, tendo por objeto 2.623 lotes, distribuídos em 78 quadras e 07 glebas, que compõem o loteamento Cidade Miguel Badra, na Cidade de Suzano, com vistas a corrigir erros relativos à descrição de determinados lotes, mais especificamente quanto às suas medidas, confrontações e vias públicas em que se localizam.

 

Conforme ressaltado pelo I. Representante do Ministério Público em Segundo Grau, não é, porém, a ata notarial o meio hábil para a pretendida retificação de escritura pública, que, ao contrário, só pode ser retificada por outra escritura, presentes as mesmas partes ou seus sucessores.

 

Este tem sido o entendimento reiterado da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, isto é, de que a retificação de uma escritura só pode se dar, em princípio, através de novo ato notarial, qual seja através da lavratura de escritura de re-ratificação, admitindo-se apenas por exceção, quando verificado erro material evidente, a intervenção da autoridade administrativa para corrigi-lo (Processos CG 129/87, 114/89, 178/96, 98/00).

Descabe, portanto, ao Tabelião ou ao MM. Juiz Corregedor Permanente substituir a atuação das partes para o fim de emitir, no lugar destas, uma declaração modificativa da declaração original.

Muito elucidativo a respeito o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria, Dr. Roberto Maia Filho, aprovado pelo eminente Desembargador Gilberto Passos de Freitas, então Corregedor Geral da Justiça, no Processo CG – 128/2007:

 

‘O óbice está em se dotar o Notário, Registrador ou mesmo o Juiz Corregedor Permanente, como tal atuando no âmbito administrativo, de poder retificatório unilateral.

Nesse sentido, em precedente análogo sobre o tema, já se decidiu que “permitir essas correções, ainda que indícios apontem no sentido da ausência de prejuízo potencial a terceiros, seria munir o agente administrativo de poderes de que não dispõe capazes de interferir com a manifestação da vontade da parte que já a deixou consignada formalmente no título causal” (Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça, ed. RT 1989, p. 242, nº 127).’

 

De igual feição, o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria, Dr. José Marcelo Tossi Silva, no Proc. CG n° 834/2005, aprovado pelo eminente Desembargador José Mário Antonio Cardinale, então Corregedor Geral da Justiça, com o seguinte teor:

‘Neste Órgão Censório, por outro lado, tem prevalecido o entendimento de que a retificação de atos notariais, pela via administrativa, somente é possível quando se tratar de erro material evidente, verificável desde logo. Neste sentido o r. parecer da MM. Juíza Auxiliar da Corregedoria, Dra. Maria Adelaide de Campos França, no Proc. 98/90, em que se verifica:

 

A emenda de atos notariais mediante intervenção do Poder Público é admitida, tão-somente, quando as circunstâncias indicam ser o erro material evidente, independente de qualquer conjectura e verificável a olho nu. Tal admissão da correção de mero equívoco material pela via administrativa encontra seu fundamento no poder de autoridade da Administração Pública sobre seus próprios atos” (Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo - 1990, Coord. Des. Onei Raphael Pinheiro Oricchio, Ed. RT, págs. 210/211).

 Este posicionamento se justifica porque não é possível ao tabelião e ao juiz, em procedimento administrativo, alterar a manifestação de vontade das partes, consubstanciada na escritura pública, mediante modificação da descrição da coisa que foi objeto da compra e venda. Ainda neste sentido a r. decisão proferida pelo Desembargador Márcio Martins Bonilha no Processo CG nº 1.429/96, da Comarca de Poá, em que foi aprovado parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria, Dr. Francisco Eduardo Loureiro, com o seguinte teor:

 “Como muito bem colocado pela Dra. Curadora de Registros Públicos em sua manifestação de f., a retificação de escritura depende de novo ato volitivo das próprias partes contratantes, não se prestando, a priori, à retificação judicial.

Na expressão de Pontes de Miranda, "falta competência aos juizes para decretar sanções e até para retificar erros em escrituras públicas: escritura pública somente se retifica por outra escritura pública" (Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado. São Paulo: RT. t. 3, 338 p. 361).

No mesmo sentido, absolutamente pacífica é a doutrina (Washington de Barros Monteiro. Curso de Direito Civil, v. 1, p. 263; Miguel Maria de Serpa Lopes. Curso de Direito Civil, v. 6, p. 533; Valmir Pontes. Registro de imóveis., p. 124-125).

Em artigo específico sobre o tema, ficou assentado que:

"Não podem, pois, os juízes e nem os Oficiais de Registro de Imóveis corrigir equívocos constantes de escrituras públicas, uma vez que não têm eles competência para isso.

 Na hipótese de o erro constar originariamente de escritura pública, então as partes interessadas deverão proceder à retificação do instrumento através de outra escritura pública, desde que estejam presentes e em condições de exprimir sua vontade.

Quando, porém, houver impossibilidade, tal como acontece quando um dos participantes vem a falecer, seus herdeiros, nesse caso, poderão substituí-lo na prática do ato notarial" (Luiz Amorim e José Celso de Mello Filho, "Aspectos da escritura pública". RJTJESP 45/13).

Em mais de uma oportunidade, já deixou esta Corregedoria Geral da Justiça fixado que cabe ao Tabelião representar o fato presenciado ou apreendido, como redator fiducial, sem acrescentar elementos volitivos não-colimados pelos comparecentes. Via de conseqüência, não cabe ao Tabelião e nem ao Estado, ressalvada a via jurisdicional própria (sem caráter retificatório, entretanto) intervir para alterar o fato retratado na escritura (Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, ano de 1987, ementa 56, p. 116, ementa 59, p. 116, ementa 90, p. 177; Decisões, ano de 1988, ementa 81, p. 139, ementa 96, p. 168).

Entender o contrário significaria permitir que na esfera retificatória, ou seja, em sede puramente administrativa ou em jurisdição graciosa, pudesse ser alterada à vontade das partes, livremente manifestada no ato notarial.

É por isso que o art. 213, da Lei n 6.015/73 trata exclusivamente da retificação do registro, não fazendo, todavia, menção à retificação de escritura, como forma de preservar a pureza da manifestação de vontade instrumentalizada pelo Tabelião”.

A retificação pleiteada pelos requerentes altera a posição do imóvel no solo e por não se tratar de correção de erro evidente deverá ser feita mediante escritura de re-ratificação.’

As correções requeridas pelos interessados, que dizem respeito à descrição dos lotes e são de monta, conforme se verifica do rol de fls.04/06, não caracterizam, pois, erro evidente, não se podendo prescindir ‘in casu’ da escritura de re-ratificação.

 

Outro não é o magistério de Narciso Orlandi Neto, in Retificação do Registro de Imóveis, Ed. Oliveira Mendes, 1997, p.90, segundo o qual “Não há possibilidade de retificação de escritura sem que dela participem as mesmas pessoas que estiveram presentes no ato da celebração do negócio instrumentalizado. É que a escritura nada mais é que o documento, o instrumento escrito de um negócio jurídico; prova preconstituída da manifestação de vontade de pessoas, explicitada de acordo com a lei. Não se retifica manifestação de vontade alheia. Em outras palavras, uma escritura só pode ser retificada por outra escritura, com o comparecimento das mesmas partes que, na primeira, manifestaram sua vontade e participaram do negócio jurídico instrumentalizado’.

A propósito das eventuais dificuldades que podem surgir com a necessidade de ser lavrada escritura de retificação, complementa o festejado doutrinador:

 

‘Se aquele que deve participar da escritura de retificação faleceu, cumpre pedir ao juízo do inventário que, ouvidos todos os interessados, autorize, por alvará, o inventariante ou outra pessoa a comparecer à escritura de retificação e, em nome do espólio, manifestar sua vontade para ratificar o negócio feito pelo ‘de cujus’ e retificar o erro que contaminou o registro (conf. “Aspectos da Escritura Pública”, Sebastião Amorim e José Celso de Mello Filho, in Revista de Direito Imobiliário n.1/27).

 

Se a parte está desaparecida ou se recusa a comparecer à escritura de reti-ratificação, tem o interessado direito de ação para suprir o consentimento de quem não é encontrado ou, injustamente, o recusa. Em ambos os casos, será o réu citado (por editais ou pessoalmente, na forma da lei processual) para comparecer em dia e hora previamente designados, em determinado tabelião, para participar da escritura de reti-ratificação. Se não comparecer, o juiz declarará suprida a falta da declaração de vontade e expedirá alvará que será transcrito na escritura de reti-ratificação. Se o réu é a única pessoa que deve comparecer à escritura, além do interessado na retificação, pode o juiz simplesmente declarar suprido o consentimento para a reti-ratificação. Nesta hipótese, a carta de sentença será o documento hábil para a retificação do registro.’

 

Por fim, tampouco há que se falar na pretendida retificação da escritura através de ata notarial, visto que, nos dizeres de Leonardo Brandelli, in Teoria Geral do Direito Notarial, 2ª ed., Saraiva, 2007, p.249, ‘A ata notarial é, enfim, o instrumento público mediante o qual o notário capta, por seus sentidos, uma determinada situação, um determinado fato, e o translada para seus livros de notas ou para outro documento. É a apreensão de um ato ou fato, pelo notário, e a transcrição dessa percepção em documento próprio’.

 

E ao tratar do objeto da ata notarial, Brandelli lança uma pá de cal na controvérsia suscitada pelos ora recorrentes ao esclarecer que ‘o objeto da ata notarial é obtido por exclusão, isto é, para ser objeto de ata notarial não pode ser objeto de escritura pública, (...)’ (grifei)

 

Ante o exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de que a apelação interposta pelos recorrentes seja recebida como recurso administrativo, na forma do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, e que a ele seja negado provimento.

Sub censura.

São Paulo, 26 de fevereiro de 2009.

(a) WALTER ROCHA BARONE

Juiz Auxiliar da Corregedoria

 Decisão: Aprovo o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria e por seus fundamentos, que adoto, recebo a apelação interposta pelos recorrentes como recurso administrativo, na forma do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo e nego-lhe provimento. Publique-se. São Paulo, 5 de março de 2009. (a) RUY PEREIRA CAMILO - Corregedor Geral da Justiça

 


Voltar às notícias Compartilhe ou salve em seus favoritos:
Mais... Stumble It Compartilhe no Google Compartilhe no Delicious Compartilhe no Twitter Compartilhe no Facebook Imprimir Email This